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Cremesp traz à discussão nova resolução do CFM sobre publicidade médica


A 1ª Jornada Jurídica do Cremesp, realizada em 9 de dezembro, no auditório da Sede, reiterou uma parceria salutar estabelecida pela atual gestão do Conselho: entre médicos e advogados paulistas, a bem da Ética e da Justiça. O tema escolhido para o primeiro desses encontros versou sobre a nova regra para publicidade médica, expressa na , que traz mudanças significativas à área e entra em vigor em 13 de março de 2024. O evento contou com a participação de autoridades médicas e jurídicas, em conferências e painéis distribuídos nos períodos da manhã e tarde.


Já no início do evento, Angelo Vattimo, presidente do Cremesp, afirmou que a jornada destina-se a selar a interface entre médicos e advogados, que devem se alinhar em seu trabalho para o bem comum, cada qual fazendo sua parte. “Não somos adversários. Essa é a realidade do século XXI, no qual as normas, em especial, éticas, envolvem ambas as profissões que, por isso, não devem falar linguagens diferentes”. Para Carlos Magno Michaelis Júnior, procurador jurídico do Conselho e organizador da jornada, a Medicina e o Direito em São Paulo caminham juntos, em sintonia, “com ênfase ao âmbito ético, no Cremesp, e no jurídico, na Ordem dos Advogados de São Paulo, Seção São Paulo (OAB-SP)”.


Além de Vattimo e Michaelis, compuseram a mesa de abertura Irene Abramovich, diretora 1ª. secretária do Conselho, que considera que “discutir publicidade é fundamental em um tribunal ético como o Cremesp”; Emmanuel Fortes Cavalcanti, 3º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM) e relator da Resolução. CFM nº 2.336/2023; Patrícia Vanzolini, presidente da OAB-SP; e Marcos da Costa, secretário de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, do Governo do Estado de São Paulo, representando, na ocasião, Tarcísio de Freitas, para quem “discutir a publicidade é discutir principalmente a má publicidade em atos privativos médicos por pessoas não habilitadas”.


Conferências

“O Direito e a Medicina Juntos” foi o mote da primeira conferência da jornada, proferida por Patrícia entende que há muito mais pontos em comum entre as duas profissões do que se imagina. “Estivemos separados por um bom tempo devido à ilusão de autossuficiência. Os advogados são médicos da sociedade. Se há um desequilíbrio trazido, por exemplo, por falta de inclusão, ódio ou racismo, temos uma sociedade doente e, então, a Justiça deve agir para tratá-la, usando como remédio o pacto social estabelecido: a lei”. Em relação à publicidade, Patrícia crê ser necessário reformular as regras, pois muitas se tornaram tão obsoletas e com excesso de rigor, que faz com que estas não sejam cumpridas.


Na sequência, a conferência A Nova Resolução da Publicidade Médica foi proferida por Cavalcanti, do CFM, e presidida por Vattimo, tendo como secretário Alexandre Kataoka, coordenador da Assessoria de Comunicação da autarquia, que participou com sugestões da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica na elaboração da norma e da Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos (Codame), no CFM. “Havia muita dificuldade de cumprir a norma anterior, muito defasada quanto à realidade atual. Buscou-se ao máximo uma uniformidade na linguagem, em uma releitura que segue as leis federais, em especial, sobre o que significam ‘sensacionalismo’, ‘autopromoção’, e ‘concorrência desleal’, para evitar-se uma interpretação equivocada”.


Em sua palestra, Cavalcanti esboçou a trajetória do Conselho Federal até se chegar a um novo texto que vigorará só em meados de março de 2024, mas foi construído com diálogo, a partir de três anos de estudos para revisão. E depois de consulta pública que reuniu 2.656 sugestões, além de contribuições escritas de sociedades de especialidades; com a realização de quatro webinários, que reuniram profissionais de Marketing, Publicidade, Jornalismo, Direito e Contabilidade.


As mudanças propostas objetivaram atualizar a resolução anterior – CFM n° 1974/2011 – pois, apesar de superar muitos subjetivismos das normas anteriores, continuou restritiva e datada, pois eram aplicáveis aos meios de comunicação da época. “Com o incremento das redes sociais e o fácil manejo para a produção de mídias, o controle do veiculado se tornou muito difícil”, comentou o relator. Segundo ele, as mudanças sugeridas terão essencialmente a função de esclarecimento ao paciente e de permitir ao médico que faça a divulgação do seu trabalho, sempre de maneira ética e objetiva. Entre as principais modificações no escopo da resolução estão as que permitem ao médico mostrar seu ambiente de trabalho; promover os equipamentos de sua clínicas; utilizar imagens do tipo “antes e depois” de uma maneira educativa e repostar, de forma contida, elogios de pacientes postados originalmente nas próprias mídias sociais. “Criou-se uma situação na qual o médico é o único que não pode fazer seu anúncio, mesmo eticamente. Isso acaba tirando o protagonismo do profissional, tornando-o uma pessoa insatisfeita, tolhida, e que sente que perdeu muito de sua relevância na profissão”, explicou.


“Antes e depois”

Talvez o ponto que tem merecido mais destaque na nova resolução seja o da divulgação de imagem tipo “antes e depois”. Em relação a isso, o relator garantiu: “a imagem deve estar vinculada à especialidade registrada do médico. A foto precisa vir acompanhada de texto educativo, contendo indicações terapêuticas e fatores que possam influenciar negativamente no resultado. A imagem não pode estar manipulada e nem o paciente ser identificado”.


As fotos só podem ser apresentadas “em conjunto com imagens contendo indicações, evoluções satisfatórias e insatisfatórias e possíveis complicações decorrentes da intervenção”, visando ao esclarecimento à sociedade. Outra mudança: eventos médicos deverão contar com a presença de diretor-técnico médico responsável, que responderá eticamente por desvios da norma, como a participação de não médicos em assuntos específicos da Medicina.


Garantia de resultado?

O contraponto foi estabelecido pela conferência proferida pelo ministro Marco Aurélio Gastaldi Buzzi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), A garantia contratual de resultados na Medicina, propaganda enganosa com promessa de resultado, presidida por Angelo Vattimo e secretariada por Alexandre Kataoka.


Em sua palestra, o ministro trouxe jurisprudências sobre “obrigação de resultados”, que são alvo de discordância pelos cirurgiões plásticos. Em eventuais relações de mercado, como explicita o ministro, “a cirurgia plástica tem natureza de obrigação de resultado, o que atrai a presunção de responsabilidade do médico, que deve comprovar alguma excludente de sua responsabilização pelos danos causados ao paciente”. Na visão do CFM em sua nova resolução, se o médico for obrigado a mostrar eventuais intercorrências em “antes e depois” em suas divulgações, ele não estará garantindo resultados.


Outro aspecto a ser repensado pelos médicos quanto à nova resolução, na opinião do ministro, refere-se ao “consentimento implícito” à exibição de imagens de paciente, pois há obrigação de informar sobre os riscos. Segundo ele, o blanket consent, ou seja, consentimento genérico, em que não há individualização das informações prestadas ao paciente é proibido, segundo jurisprudência.


O período da manhã da 1ª Jornada Jurídica do Cremesp contou ainda com painel sobre os efeitos práticos e cuidados da resolução para esses profissionais nos veículos de comunicação. Moderadora do debate, Eliandre Costa Palermo, conselheira do Cremesp e Dermatologista, considerou a resolução “extremamente importante para toda a classe médica, pois abre espaço para os virtuosos“, ao obrigar a divulgação inclusive aos riscos dos procedimentos. Já no painel sobre as implicações jurídicas da resolução no dia a dia do médico, Denis Calazans Loma, cirurgião plástico e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, questionou se outras especialidades, além de Cirurgia Plástica e Dermatologia, serão beneficiadas pelo novo texto. “Seguiremos uma tendência parecida com a que ocorre nos Estados Unidos, onde há uma regulamentação muito rasa, que leva a profissão cada dia mais para judicialização?”.


Implicações criminais

A segunda parte do evento foi dedicada ao estudo de casos práticos veiculados em contas de Instagram de médicos. Um deles, de estupro de vulnerável, foi analisado no painel que teve como presidente a diretora 1ª secretária Irene Abramovich. Alexandre Kataoka, coordenador da Assessoria de Comunicação do Cremesp e cirurgião plástico, apresentou o caso (sem identificação da vítima e do indiciado), do marido de uma paciente submetida à cirurgia plástica que viu uma publicação de um vídeo do cirurgião, em rede social, em que ele manipulava as mamas da esposa, sob o pretexto de “demonstrar sua técnica”, como permitiria a nova resolução do CFM. Uma vez que não só conjunção carnal como também atos libidinosos são considerados estupro, esse cirurgião foi indiciado, tanto no Cremesp quanto na Justiça comum. Para Irene, houve nítido desrespeito à paciente e exibicionismo do médico. “O caso tem vulnerabilidade inconteste e o Termo de Consentimento não absorveria essa análise. Trata-se de crime de importunação”, acrescentou Naila Cristina Nucci, advogada da Procuradoria Jurídica do Cremesp.


Convidada do painel, Mariah Martins, advogada do Conselho Regional de Medicina de Santa Catarina (CRM-SC), apontou o benefício do lapso temporal oferecido pelo CFM para adequação às novas regras da publicidade médica, que passam a vigorar em março de 2024, e afirmou que em Santa Catarina também é realizado o mesmo trabalho de conscientização aos jovens médicos que o Cremesp realiza. “Na nova resolução, este tipo de filmagem não é permitido. Isso lembra muito sensacionalismo, reprovado em qualquer atitude médica”, disse Fabio Sgarbosa, conselheiro do Cremesp. Kataoka lembrou a todos que a equipe médica que participou da cirurgia também pode ser indiciada, uma vez que “não acobertar o que está irregular e reportar à direção técnica é nosso dever. Trazemos as discussões para que os médicos não cometam essas irregularidades”, afirmou.


Defesa do consumidor

Demonstrar a infração ética do médico em prometer resultados em Cirurgia Plástica foi o objetivo do segundo caso abordado. Apresentando o debate presidido pelo conselheiro Silvio Sozinho, Kataoka declarou que, como perito, realiza cerca de 30 laudos periciais na especialidade por mês e em 80% deles não há nexo de casualidade (imperícia, imprudência ou negligência). No entanto, 50% dos cirurgiões são condenados porque há o enquadramento no Código de Defesa do Consumidor e na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Ele comentou que muitos pacientes veem casos na internet de “antes e depois” da Cirurgia Plástica sem que haja esclarecimento, por parte do médico, de que a Medicina não é ciência exata e pode haver riscos, além de que cada organismo reage de determinada maneira, impossibilitando a promessa de resultado. O erro está em divulgar de maneira diferente, mostrando apenas um caso de sucesso no resultado, o que não é permitido, conforme a antiga e a nova resolução de publicidade médica.

 

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) entende que cirurgia plástica e procedimentos dermatológicos são obrigações de fim, ou seja, de resultado e, por isso, estão sujeitas ao Código de Defesa do Consumidor, ao contrário das demais especialidades médicas (embora qualquer outro médico que prometer resultado possa ser culpabilizado). O enquadramento de publicidade enganosa é utilizado quando o profissional demonstra uma mudança estética positiva em um paciente, criando a expectativa de resultados positivos em quem vê a publicação. E, se não houver êxito, é passível de penalização do agente. Para Sandra Elizabeth Lavedonio, dermatologista convidada para o painel, o médico precisa adotar nas publicações um texto de caráter educativo sobre o procedimento que irá realizar e informar das eventuais complicações. E antes da execução do procedimento, solicitar a assinatura do termo de consentimento esclarecido.


Especialidades médicas

Angelo Vattimo, que presidiu a tribuna livre sobre os impactos da resolução da publicidade médica nas especialidades, afirmou que ainda que a maior presença nas redes sociais seja de profissionais da Cirurgia Plástica, Dermatologia, Cirurgia Vascular e Endocrinologia, ela atinge todos os médicos que devem ter cuidado especial em não expor pacientes. Participaram do debate os representantes das sociedades de especialidades: Cláudio Barsanti, 2º vice-presidente da Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP); Fernando Cordeiro, diretor de Defesa Profissional da Associação de Coloproctologia do Estado de São Paulo; Koji Tanaka, representante da Sociedade Paulista de Neurocirurgia; e César Politi, assessor jurídico do Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura (CMBA).


No encerramento da 1ª Jornada Jurídica do Cremesp, Irene destacou a participação presencial e online de representantes de outros conselhos de Medicina do país na discussão, assim como Carlos Magno Michaelis Junior, procurador jurídico, destacou a parceria do Cremesp com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o governo do Estado de São Paulo. “Temos em tramitação 6 mil processos e 5 mil sindicâncias, grande parte por publicidade. Mas esta gestão está cada vez mais empenhada em investir em orientação aos médicos para que eles não caiam na armadilhas que levem ao descumprimento ético”, afirmou Vattimo.


Assista à íntegra da 1ª Jornada Jurídica do Cremesp no canal do Cremesp no YouTube.


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