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Atualização de conhecimentos sobre os efeitos do álcool na gestante, no feto e no recém-nascido


A Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP) promoveu, em sua sede, no dia 14 de setembro, o Café da Manhã com o Professor – Efeitos do álcool na gestante, no feto e no recém-nascido. Organizado pela Diretoria de Cursos e Eventos e pelo Grupo de Estudos sobre os Efeitos do Álcool na Gestante, no Feto e no Recém-Nascido da SPSP, o evento teve por objetivo divulgar e atualizar as informações em relação ao tema para pediatras, público geral e outros profissionais. A coordenação das palestras ficou a cargo da pediatra e ex-presidente da SPSP, Conceição A. Mattos Segre, coordenadora do Grupo de Estudos.


O ginecologista e obstetra Coríntio Mariani Neto, diretor técnico do Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros, ressaltou que um grande desafio para o médico obstetra é o fato do álcool ser uma “droga lícita”, de ampla utilização social e potente psicotrópico, que afeta o sistema nervoso central. “O álcool pode levar à dependência e, na gestação, ele acabará sendo a causa da DESAF/SAF (Distúrbio do Espectro da Síndrome Alcoólica Fetal/Síndrome Alcoólica Fetal)”, ressaltou.


Conforme salientou Mariani, a biodisponibilidade do álcool é maior na mulher do que no homem. “A mulher tem maior absorção do álcool e maior proporção de gordura corpórea, bem como menor quantidade de água total no organismo e maiores concentrações séricas de etanol, o que leva à embriaguez mais rapidamente, além de complicações físicas mais precoces e graves”, explicou o médico.


Ele comentou que uma metanálise sobre o uso do álcool por gestantes constatou que a exposição ao álcool durante a gravidez determina um risco maior de abortamento em comparação à abstenção. No estudo, cada dose adicional por semana foi associada a um aumento de 6% nesse risco. “Dessa maneira, como a dose segura de álcool para cada gestante não foi definida, a SPSP, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), a Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo (Sogesp) e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) recomendam total abstinência durante a gravidez.”

Hermann Grinfeld, membro do Grupo de Estudos organizador do evento, destacou o quanto é difícil avaliar o consumo de álcool durante a gravidez, seja pela omissão da paciente ou pela negação da informação. “Dessa forma, temos os marcadores de consumo de álcool na gestante – que podem ser bioquímicos – e também questionários, como, por exemplo, o T-ACE (um teste de pontuação que avalia questões relacionadas ao consumo de bebida alcoólica). Sendo assim, quanto mais alta a pontuação, maior é a propensão para um consumo alcoólico de risco durante a gestação”, observou.


Em relação aos avanços dos biomarcadores, o médico esclareceu que derivados do metabolismo não oxidativo do álcool, que incluem o etil-glucoronídeo, o etil-sulfato e o fosfatidiletanol, podem ser uma janela temporal na detecção de ingestão de álcool pelas gestantes. “Além disso, o etil-glucoronídeo pode desempenhar papel importante na confirmação de ingestão pré-natal de álcool. E pesquisa em cabelo de gestantes – mais eficiente que em urina ou sangue – permite medida retrospectiva de até vários meses.”


Na sequência, Maria dos Anjos Mesquita, também membro do Grupo de Estudos, enfatizou que o álcool é considerado o agente teratogênico fetal mais comum, que afeta o crescimento e o desenvolvimento do feto em todos os estágios da gravidez, tendo se tornado um problema de saúde pública em escala mundial. “De todas as substâncias de abuso, incluindo cocaína, heroína e maconha, o álcool é o que produz os efeitos neurocomportamentais mais graves no feto”, alertou a pediatra.


Maria dos Anjos pontuou que a taxa de eliminação de álcool no feto corresponde de 3 a 4% em relação à taxa materna e isso faz com que a alcoolemia fetal seja muito maior do que a materna. “O feto é particularmente vulnerável ao consumo de álcool materno, por causa da sua eliminação ineficiente e da exposição prolongada, e é pouco provável que um único mecanismo explique todos os efeitos maléficos da exposição fetal ao etanol na vida intrauterina, embora estudos apontem alguns principais efeitos do álcool no desenvolvimento fetal, entre os quais a morte celular, alteração do crescimento dos tecidos e alterações funcionais dos órgãos e sistemas.”


Maria dos Anjos Mesquita deu prosseguimento às palestras, abordando os efeitos do álcool no recém-nascido. A médica afirmou que os danos provocados pelo álcool durante o período intrauterino irão se manifestar por alterações físicas, mentais, comportamentais e de aprendizado, tais como restrição de crescimento, anomalias faciais e disfunção do sistema nervoso central.


“As implicações mais nocivas, incapacitantes e permanentes da exposição pré-natal ao álcool são o comprometimento do desenvolvimento e das funções cerebrais”, esclareceu a pediatra, salientando que o sistema nervoso central é, portanto, o órgão mais afetado, trazendo alterações cognitivas e comportamentais, como retardo mental, dificuldade de aprendizado, alterações da memória, convulsões, déficit de atenção e hiperatividade, dificuldade no controle de impulsos, entre outros.


Por fim, outro problema citado pela especialista foi a síndrome de abstinência alcoólica, que faz o recém-nascido apresentar uma série de sinais inespecíficos, entre os quais irritabilidade, hipersensibilidade, tremores, alterações no sono, apneia, recusa alimentar etc. “Importante lembrar que a mulher que amamenta e faz uso de bebida alcoólica deve ficar de duas a três horas por dose consumida sem amamentar o seu bebê”, orientou.


Tratamento, prevenção e seguimento

A coordenadora do evento, Conceição Segre, ressaltou não existir tratamento curativo para a SAF/FASD. “O que existe é apenas um tratamento de suporte, realizado por uma equipe multidisciplinar que, quanto mais precocemente instalado, melhores serão os resultados. Dessa forma, a única maneira de se prevenir 100% a FASD é a abstinência total de álcool”, enfatizou, alertando que não se conhece quantidade segura de consumo de álcool durante a gestação.

A pediatra relatou que são necessárias várias estratégias relacionadas ao tratamento de suporte, entre as quais as intervenções clínicas, que englobam o suporte nutricional (controle de peso, estatura, IMC etc.), controle de comorbidades (triagem visual e auditiva), controle de distúrbios comportamentais (atuação de psicólogos e psiquiatras) e intervenções farmacológicas (apenas sintomáticas). “Além disso, é papel das sociedades médicas, das universidades e das instituições que atendem gestantes divulgar os conhecimentos sobre o tema para as equipes de saúde e para a população em geral”, observou.


Márcia de Freitas, membro do Grupo de Estudos, destacou que o prognóstico para os indivíduos com SAF/FASD é muito variável e os problemas mais frequentes englobam os transtornos de saúde mental; confinamento em prisão, centros de tratamento de abuso de drogas ou álcool ou em uma instituição para doentes mentais; maior uso de drogas psicotrópicas; maiores taxas de admissão hospitalar por abuso de álcool, entre outros.


A médica citou um estudo canadense que mostra que a expectativa de vida dos pacientes com SAF é de 34 anos. Já em relação as causas de morte, 44% são externas (suicídio, acidentes, drogadição, alcoolismo) e uma parcela das mortes ocorre por doenças do sistema nervoso central, aparelho respiratório, malformações congênitas, cardiopatias e doenças mentais. “Todos os problemas apresentados pela criança devem ser tratados e seguidos, concomitantemente, por serviços especializados que ofereçam suporte e recursos preventivos para o paciente a para a sua família”, ressaltou a pediatra. “Somos todos responsáveis pela prevenção desta epidemia silenciosa”, conclui.


#SPSP #Sociedade de Pediatria de São Paulo # SAF #Álcool na Gestação

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